Hoje, a esta casa, regressou a Democracia. O Voto da maioria triunfou e abriu um novo caminho de esperança, de mais justiça social. As pessoas concretas e os seus reais problemas passam a contar mais que os interesses egoístas dos "mercados".
A aritmética foi clara, 62% dos eleitores votaram contra a austeridade assassina que empobreceu deliberadamente o país, contra 38% que ainda acreditaram que tal política era melhor.
E são os representantes dos 38% que afirmam ter ganho e querem governar a todo o custo para manter a mesma política suicida. Mais, agarrados ao poder e às mordomias acusam os outros de quererem assaltar ilegalmente o poder. Desfaçatez nunca lhes faltou.
Hoje abri a garrafa de champagne que estava desde Domingo no frigorífico à espera desta votação, e aqui em casa brindamos à Esperança num Portugal melhor, mais justo e decente.
MC
José Vítor
Malheiros ESPERANÇA!
10/11/2015
Sabemos que os tempos que se avizinham
serão difíceis. Um governo que defenda estes princípios será atacado por todos
os interesses.
Tomemos um exemplo.
Apenas um exemplo. “Proibição das execuções fiscais sobre a casa de morada de
família relativamente a dívidas de valor inferior ao valor do bem executado e
suspensão da penhora da casa de morada de família nos restantes casos”.
É uma das 70 medidas sobre as quais PS,
PCP, BE e PEV chegaram a acordo.
Será uma medida justa? É justa. Haverá
algo mais elogioso que se possa dizer de uma medida política? Haverá alguma
etiqueta mais nobre no dicionário? Penso que não. Haverá algo que seja melhor
para a sociedade, para a economia, para o desenvolvimento, do que uma medida
justa? Penso que não. Porque as pessoas tratam os outros como são tratadas e
nada pode ser melhor para uma sociedade onde todos tentam ser justos, onde todos
tentam fazer o bem.
É uma medida humana, feita à medida das
pessoas. Uma daquelas que quereríamos que alguém tomasse em nossa defesa e em
defesa da nossa família se estivéssemos naquela posição de fragilidade e, por
isso, simplesmente por isso, uma medida que é justo que todos tomemos em defesa
dos outros.
Qual é o benefício? Retirar de cima das
famílias, dos pais, o terror de que os seus filhos sejam forçados a viver na
rua, a vergonha de que a sua família seja obrigada a esmolar abrigo junto de
familiares ou amigos, roubando-lhes o resto de dignidade que o desemprego, as
dívidas e a pobreza não levaram ainda. Tirar a casa a uma família é condená-la
a uma pena perpétua, se não de miséria pelo menos de opróbrio, de vergonha e de
medo. E no entanto… no entanto… quantos milhares de famílias não foram assim
lançadas para o inferno nos últimos anos, em nome de uma política cega que
considerava que era preciso castigar as pessoas mais frágeis pela sua
fragilidade e de uma burocracia apenas capaz de ver números onde havia pessoas?
Quantos milhares de famílias não foram assim lançadas para o inferno em nome de
uma destruição redentora que as tornaria mais fortes, mais eficientes, mais
diligentes? Quantas crianças não foram lançadas para a rua para ensinar aos seus
pais que deviam ser mais empreendedores?
Qual é o prejuízo desta medida? Qual é o
inconveniente, o custo? Nenhum. As dívidas podem ser cobradas de outra forma,
eventualmente penhorando até outros bens (salários, bens móveis) e o facto de
uma família não ser condenada ao desespero aumenta a probabilidade de que um
dia venha a equilibrar a sua vida e pagar com mais facilidade as suas dívidas.
Se houvesse apenas esta medida no
acordo, isso seria suficiente para marcar o dia da sua assinatura com uma pedra
branca. Mas não há. Como esta há muitas outras, que têm em comum algumas
preocupações centrais: a protecção dos mais frágeis, a inclusão dos mais
sacrificados, o reforço dos serviços públicos essenciais, a sustentabilidade
ambiental.
Sabemos que isto é apenas o início, mas
é um início auspicioso. Um programa que protege os cidadãos acima de tudo, em
vez do dinheiro. Um programa que olha para os cidadãos como tendo todos a mesma
dignidade.
Sabemos que isto é apenas o início e que
tudo o que segue, daqui para a frente, será muito difícil. Mas todas as
dificuldades são bem-vindas quando se trata de construir um futuro solidário,
sem excluídos, sem escorraçados, sem párias. Um futuro como sonhámos depois do
25 de Abril e que depois, sem que se tenha percebido bem porquê, se perdeu em
labirintos, intrigas e areias movediças.
O acordo PS-BE-PCP-PEV não é uma
esperança porque garante a estabilidade do governo do PS, em vez de um governo
PSD-CDS. O acordo da esquerda é uma esperança porque ele esboça de novo um
programa que defende os direitos de todos contra os privilégios de alguns, o
bem-estar de todos contra a ganância de alguns, a liberdade de todos contra os
abusos de alguns, a igualdade de todos contra as prerrogativas de alguns, a
solidariedade de todos contra o egoísmo de alguns.
Sabemos que os tempos que se avizinham
serão difíceis. Um governo que defenda estes princípios será atacado por todos
os interesses, por todos os privilegiados de todos os privilégios, por todos os
preconceitos, por todos os rancores. Sabemos que as primeiras frentes de ataque
se concentrarão nas frestas existentes entre os vários signatários, tentando
desfazer o seu acordo, ampliar diferenças, acicatar rivalidades, difundir
intrigas, comprar traições. Sabemos que o acordo que hoje celebramos tem
fragilidades porque acabou de nascer e porque vai ter de ser reconstruído
dia-a-dia pelos seus autores, numa prática quotidiana de debate que confronte
todas as diferenças sem perder de vista os grandes objectivos. Sabemos que
muito pouco está garantido e muito está em jogo. Mas também sabemos que temos
muito aliados dentro e fora das fronteiras, em todos os homens e mulheres de
boa vontade. Sabemos que a honra é mais forte que a ignomínia. Que a dignidade
é mais forte que a subserviência. Que a liberdade é mais forte que a submissão.
E sabemos, enfim, que podemos ter esperança.
jvmalheiros@gmail.com