Aqueles que põem o seu dinheiro a bom recato
04/10/2016
Transferir a fortuna é
muitas vezes um crime e quase sempre uma imoralidade que penaliza os
cumpridores.
1. Há quem defenda que, em Portugal, não vale a pena
tentar taxar os ricos porque há muito que os ricos portugueses tiraram toda a
sua fortuna do país.
A expressão usada costuma
ser “os que têm dinheiro já o puseram a bom recato” e é dita em geral não só em
tom compreensivo mas com uma indisfarçável admiração pela habilidade
demonstrada. Quanto ao “bom recato” é, evidentemente, um sítio onde o fisco não
consiga chegar, um paraíso fiscal. A expressão revela uma ideia do fisco como
uma entidade usurpadora, a par de um total alheamento do que seja a noção de
bem público e um quadro conceptual onde os ricos possuem, talvez por direito
divino, o privilégio de beneficiar do trabalho dos outros e dos serviços
públicos pagos exclusivamente pelo dinheiro dos trabalhadores. É a posição dos
que, no fundo, pensam, como Donald Trump, que os impostos são para os parvos e
que fugir ao fisco é sinal de esperteza.
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O mais espantoso é
que, quem ouve, assente muitas vezes com compreensão, esquecendo que essa
colocação do dinheiro a “bom recato” é muitas vezes um crime e quase sempre uma
imoralidade, que obriga os que não fogem ao fisco a suportar um esforço fiscal
desproporcionado, pagando as estradas onde circulam os ricos.
O pensamento desses
críticos da taxação dos ricos é que, se se taxarem os ricos eles fogem com os
seus capitais e, sendo assim, é melhor deixá-los em paz sem os incomodar com o
fisco, já que o resultado será o mesmo. Mas, mesmo que fosse assim (e não é)
haveria a considerar a pequena questão da justiça fiscal. De facto, a política
fiscal não serve apenas para financiar o Estado e deve ter uma função
redistributiva, de forma a contrariar a acumulação crescente de toda a riqueza
num número cada vez mais reduzido de mãos e a permitir que os mais
desfavorecidos à partida possam ter a possibilidade de melhorar as suas
condições de vida, nomeadamente através do sistema público de educação.
Como diz um dos homens
mais ricos do mundo, o americano Warren Buffett, não suspeito de bolchevismo, o
mercado pode ser “o melhor mecanismo para garantir que os recursos são usados
da forma mais eficiente e produtiva (...) mas não é muito bom a garantir que a
riqueza produzida é distribuída de forma justa ou sensata”. Porquê? Porque a
riqueza passa de pais para filhos e acaba nas mãos de pessoas que não
contribuíram de forma alguma para a produzir nem mostraram possuir, mesmo
segundo o pensamento neoliberal, qualquer mérito que deva ser premiado. Para
regressar às palavras de Warren Buffett, o que fazemos quando deixamos de taxar
o património dos mais ricos de forma mais pesada, é como se “seleccionássemos
para os Jogos Olímpicos de 2020 os filhos dos atletas que foram seleccionados
nos Jogos Olímpicos de 2000”.
2. A propósito da
taxação dos patrimónios imóveis mais valiosos, anunciada para o orçamento de
2017, ouvimos muitas das críticas referidas acima e, de uma forma geral,
propagandear a ideia de que “a esquerda está contra os ricos”. De facto,
haveria muitas boas razões para estar contra “os ricos”. A História não é avara
em exemplos. Mas, pessoalmente, situado como estou na grande área política das
esquerdas, onde confluem muitas ideias e muitas tradições diferentes, não me
sinto especialmente contra os ricos. Se há uma coisa que acho admirável é
correr o risco de investir, de criar uma empresa, criar emprego e produzir
coisas úteis. E acho da mais elementar justiça que uma pessoa dessas enriqueça,
desde que pague os seus impostos, respeite as leis e trate os trabalhadores de
forma digna. O que acontece e é lamentável é que os ricos que merecem o nosso
respeito são escassos. O que merece o meu antagonismo declarado são aquelas
pessoas que enriquecem de forma incompreensível e que, para mais, se recusam a
fazer a sua quota-parte na sociedade. Ou aquelas que, em vez de pagar impostos
em Portugal, registam as suas empresas na Holanda ou no Luxemburgo para pagar
menos e decidem pôr o seu dinheiro ”a bom recato” para que sejam apenas os que
têm menos dinheiro a pagar as escolas e os hospitais.
JVM
Trump
justifica-se: apenas usou “brilhantemente” as leis fiscais para pagar menos
PÚBLICO
04/10/2016
Fundação do candidato presidencial republicano foi proibida de angariar
mais fundos. Trump usou expediente fiscal para escapar aos impostos durante 18
anos.
O actual presidenta da Comissão Europeia ajudou o Luxemburgo a transformar-se
num paraíso fiscal. O Durão Barroso sai da Comissão e vai para dirigente do
banco mais odiado do planeta.
O Belmiro do Continente e o Soares do Pingo Doce usam também
"brilhantemente" as leis holandesas para não pagarem os impostos em
Portugal devidos aos lucros com o nosso dinheiro.
"Não sei se ria ou se chore", diz
vice de Merkel sobre o CEO do Deutsche Bank
03/10/2016
O ministro da Economia
não gostou das declarações do responsável pela instituição bancária, que
atribui os recentes problemas que o banco enfrenta à especulação bancária.
O vice-chanceler
alemão e ministro da Economia, Sigmar Gabriel, não gostou dos mais recentes
comentários do presidente executivo do Deutsche Bank, John Cryan, sobre a actual
situação do banco alemão. O vice-chanceler acusa o CEO de má gestão.
O ministro da Economia
respondeu este domingo às declarações de John Cryan de sexta-feira, que em nota
interna lembrava que a “confiança é a base do sector financeiro”. “Algumas
forças do mercado estão a tentar prejudicar esta confiança”, escreveu o CEO do
banco alemão, citado pela Bloomberg. John Cryan insistiu que “o Deutsche Bank
tem muitos problemas, mas a liquidez não é um deles”.
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A resposta de Berlim
chegou dois dias depois. "Não sei se ria ou se chore com o facto de o
banco que teve um modelo de negócio baseado na especulação diga, agora, que é
vítima de especulação", afirmou o vice-chanceler de Merkel, durante uma
viagem de avião para o Iraque.
Citado pela Reuters e
pelo Financial Times, o ministro da Economia sublinhou ainda a sua
preocupação com os 100 mil trabalhadores do banco alemão. "O cenário são
milhares de pessoas que vão perder o seu trabalho. Vão pagar o preço da loucura
dos dirigentes irresponsáveis", disse Sigmar Gabriel.
NOTA : E eu sei que
milhões choram e outros milhões estão a caminho de chorar pelo sofrimento das
suas vidas fora os que se suicidaram. E os responsáveis "brilhantes"
pela especulação insensível e desumana o que sofreram?
MC
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