A pergunta que se impõe é qual a razão que permite a sua existência e continuação?
O artigo que se divulga é mais uma posição contra a sua existência, uma posição ética e moral, necessária, mas sabemos que vai ter pouco impacto. Mas temos de continuar a denuncia.
A outra pergunta que coloco é : qual a razão que leva a que todos os governos do mundo estejam calados sobre o assunto?
Martins Coelho
Tempo de agir
nos paraísos fiscais
MIGUEL URBÁN
MALIN BJÖRK
MARISA MATIAS
NIKOLAJ VILLUMSEN
YOUNOUS OMARJEE
Agora é o
tempo de agir – de uma vez por todas! Porque as promessas firmes para acabar
com os paraísos fiscais converteram-se em palavras vazias.
3 de Maio de
2018
Os paraísos fiscais e a evasão fiscal corroem o Estado Social. É por isso
que, em vários parlamentos nacionais, iremos trabalhar em iniciativas legislativas
para uma lista negra de paraísos fiscais mais abrangente e com sanções bem mais
eficazes.
Um sistema fiscal sólido e justo é uma das bases do Estado Social. Se
queremos professores nas escolas, médicos nos hospitais e assistência social
durante a reforma, precisamos de um sistema tributário que funcione.
É por isso que é tão grave que as multinacionais continuem a ser
autorizadas a ocultar lucros em paraísos fiscais e a jogar com os Estados, que
competem uns com os outros, para obter acordos fiscais lucrativos. A
optimização fiscal agressiva é uma prática gananciosa sem escrúpulos e
prejudica seriamente os nossos sistemas tributários.
Nesta perspectiva, nós enquanto principais forças progressistas da
Dinamarca, Espanha, França, Suécia e Portugal, apelamos a verdadeiras soluções
para as grandes questões transfronteiriças do nosso tempo e decidimos começar
por abordar a questão dos paraísos fiscais.
Na sequência dos casos LuxLeaks, Panama e Paradise
Papers, todos concordaram que era imprescindível lutar contra os paraísos
fiscais. Agora é o tempo de agir – de uma vez por todas! Porque as promessas
firmes para acabar com os paraísos fiscais converteram-se em palavras vazias.
A lista negra de paraísos fiscais da UE é um claro exemplo disso mesmo. A
começar pela definição de paraísos fiscais, a lista negra da UE eliminou o seu
próprio objectivo antes mesmo de começar, ao indicar claramente que uma taxa de
imposto de 0% sobre as sociedades não constitui em si mesmo uma violação do
critério de tributação justa. Ora, se uma taxa de imposto de 0% sobre as
sociedades não é injusta, então o que é?
Como já é hábito na UE, as negociações das listas negras dos paraísos
fiscais foram feitas à porta fechada, longe da opinião pública. Várias fugas de
documentos mostraram, no entanto, que alguns Estados-membros bloquearam
activamente a criação de uma lista negra abrangente, e que os incluía. É uma
farsa criar uma lista negra e deixar de fora paraísos fiscais óbvios como
Malta, Luxemburgo, Irlanda ou a Holanda. Estes paraísos fiscais da UE custam
aos restantes Estados-membros milhares de milhões de euros em receitas fiscais,
que se perdem todos os anos.
Para piorar as coisas, as promissoras reformas dos paraísos fiscais foram
removidas da lista negra e transferidas para a chamada lista cinza, evitando
assim quaisquer sanções. A lista já incompleta está agora reduzida a dez
paraísos fiscais.
Estes Estados-membros, classificados como paraísos fiscais cinza,
aprovaram, deliberadamente, legislação que permite que as multinacionais, os
chefes de Estado corruptos e os super-ricos escondam a sua riqueza. Ao
contrário de todas as evidências, a UE optou por confiar nestes paraísos
fiscais que simultaneamente afirmam estar a fazer tudo o que está ao seu
alcance para criar uma política mais justa.
Estamos muito preocupados. E o facto de a pessoa responsável pela luta
contra os paraísos fiscais e evasão fiscal ser, nada mais, nada menos, que o
presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, ex-primeiro-ministro do
Luxemburgo, em nada diminui a nossa preocupação. Juncker não foi apenas chefe
de Estado de um paraíso fiscal da UE, como usou a sua posição para negociar
pessoalmente acordos fiscais ilegais com multinacionais.
A construção da União Europeia favoreceu a livre circulação de capitais,
permitindo ao mesmo tempo políticas de dumping social, através
das quais os Estados-membros reduzem impostos para atrair capital. Além disso,
permite-se ainda a existência de paraísos fiscais, como o Luxemburgo, dentro do
espaço europeu. Este não é apenas um problema de tributação de impostos na Europa,
mas em todo o mundo, uma vez que o Luxemburgo funciona como um centro para
fluxos opacos de capitais globais.
A evasão fiscal é uma questão crescente em todo o mundo. As estimativas
colocam a receita fiscal perdida em cerca de 50 a 70 mil milhões de euros por
ano, apenas na UE. Esta é uma enorme ameaça ao Estado Social na Europa e deixa
milhões de pessoas na pobreza nos países em desenvolvimento.
Quando a UE se recusa a introduzir uma legislação sólida, os países
afectados devem agir por conta própria. Neste sentido, nós, as forças
progressistas da Europa, vamos propor iniciativas coordenadas nos nossos
parlamentos nacionais para criação de uma lista negra de paraísos fiscais
abrangente. De país para país, numa coligação de interessados, introduziremos regulamentação
mais rígida.
Queremos fortalecer os critérios de tributação justa para que países com
impostos muito baixos para as multinacionais não escapem da lista negra.
Queremos remover a lista cinza, como forma de criar pressão sobre os
paraísos fiscais europeus, mesmo que estes nos continuem a prometer a lua.
Queremos uma lista negra que inclua todos os países e jurisdições que não
cumpram os critérios – incluindo Estados-membros da UE.
Finalmente, queremos aumentar a pressão sobre os paraísos fiscais que fazem
parte da lista negra. Queremos proteger os lançadores de alerta e punir os
bancos e conselheiros fiscais ligados a paraísos fiscais. Exigimos a
possibilidade de proibir a celebração de qualquer contrato entre o Estado e
empresas envolvidas em evasão fiscal ou planeamento tributário agressivo. É
absurdo que a tomada de decisão no sector público não possa recusar contratos
com empresas que activamente enfraquecem as contas públicas.
Actualmente, proibir essas empresas de celebrar contratos públicos é
contrário à legislação europeia. Deste modo, a UE está a impedir os Estados e
os municípios de protegerem os sistemas de bem-estar social contra empresas que
fogem aos impostos. É, pois, fundamental que se altere esta legislação. Por
isso não deixaremos de desafiar a legislação europeia existente, de desobedecer
e de tentar encontrar formas para impedir essas empresas de lesar os interesses
dos cidadãos.
Este é o começo de uma longa luta. Medidas adicionais serão anunciadas nos
próximos meses – tanto no Parlamento Europeu como em muitos dos nossos
parlamentos nacionais. Combater a evasão fiscal dos poucos beneficiará os
muitos e irá proteger e fortalecer a base da nossa educação, saúde e segurança
social.
Eurodeputado e secretário europeu do Podemos, Espanha
Eurodeputada, Partido de Esquerda da Suécia
Eurodeputada, Bloco de Esquerda, Portugal
Deputado e vice-presidente do grupo parlamentar da Aliança Vermelha-Verde,
Dinamarca
Eurodeputado, La France Insoumise, França
Sem comentários:
Enviar um comentário