terça-feira, 25 de julho de 2017

OS GOVERNOS MUNICIPAIS TÊM DE TER QUALIDADE

PERTO DE ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS É ÚTIL IR CONVERSANDO SOBRE ISTO. JÁ CONHECEMOS MUITOS CANDIDATOS, NÃO SABEMOS É O QUE PROPÕEM.


OS CAMPOS DE TÉNIS FACE AO FAROL ESTÃO AMEAÇADOS. MAIS UMA RAZÃO PARA NO DIA 1 DE OUTUBRO VOTAR BEM.



Susana Peralta A qualidade dos governos municipais

A democracia local, tal como a democracia ao nível do governo central, é um processo em contínua melhoria.

24 de Julho de 2017

As eleições — para qualquer nível de governo — têm dois objectivos principais. O primeiro é escolher a alternativa que a maioria prefere, entre as diferentes visões do mundo das cidadãs e cidadãos. Ou seja, as eleições estão ao serviço do saudável confronto entre diferentes ideologias do eleitorado. O segundo objectivo é promover na gestão pública características que todos os eleitores concordam que são desejáveis: evitar a corrupção e o desperdício, ou gerir atempadamente as catástrofes, por exemplo. Existe uma palavra em inglês que define esta ideia — “accountability”.



A dois meses das eleições autárquicas, antes de entrarmos na espuma dos dias de campanha, vale a pena refletir sobre estes dois aspectos e perceber que factores são críticos para a realização dos mesmos.



O fenómeno que pode comprometer o primeiro objectivo é a abstenção, que aumentou de 26,2% nas eleições autárquicas de 1979 para 47,4% nas últimas, em 2013. Este aumento da abstenção limita a capacidade das eleições para refletir a preferência da maioria da população. Isto acontece porque as pessoas que se abstêm são diferentes daquelas que votam: menos educadas, com menor rendimento, mais jovens, menos informadas sobre a atualidade. Existe, portanto, uma parte da população que não tem as suas escolhas refletidas nos resultados eleitorais. O politólogo holandês Arendt Lipjhart diz que esta situação tem semelhanças preocupantes com o voto censitário que regulava o acesso ao sufrágio pelo património das pessoas. Por essa razão, Lipjhart defende a introdução do voto obrigatório — à semelhança da Bélgica e Austrália, por exemplo — como forma de as democracias modernas garantirem que as eleições refletem as posições de todo o eleitorado.

No que respeita ao segundo objectivo, existem vários trabalhos de investigação atuais que apontam para a importância da transparência e da participação dos eleitores na promoção da accountability dos eleitos. Uma análise de municípios alemães dos economistas Benny Geys, Friedrich Heinemann e Alexander Kalb mostra que os municípios onde existem movimentos de cidadãos independentes conseguem fornecer serviços públicos semelhantes a um custo inferior.

A existência de movimentos de cidadãos tem maior impacto nos municípios que conseguem gerar mais receita com impostos locais. Ou seja, esta investigação mostra que a autonomia local, em conjunto com a participação das cidadãs e dos cidadãos, melhora a eficiência da gestão pública.

Um outro exemplo é o Brasil, país em que o Orçamento Participativo foi criado na cidade de Porto Alegre no final dos anos 80, sendo hoje utilizado em mais de uma centena de cidades. Segundo o Banco Mundial, a introdução do Orçamento Participativo em Porto Alegre coincidiu com um crescimento substancial na oferta de alojamentos sociais, na rede de saneamento básico, no número de escolas. Um estudo recente mostra que as cidades com orçamentos participativos investem mais em saneamento básico e cuidados de saúde. Este investimento teve como consequência uma redução da mortalidade infantil.

Portugal tem dado alguns passos no sentido de aumentar a participação dos eleitores na política local. Houve nos anos recentes um aumento do número de orçamentos participativos. Estes são utilizados em 118 cidades, incluindo Lisboa, que foi a primeira capital europeia a adoptar o orçamento participativo, em 2008. As listas de cidadãos têm ganho importância nas eleições autárquicas. São neste momento o quarto movimento autárquico, atrás do PS, PSD e PCP — embora devamos ter em conta que uma parte destes independentes são, na verdade, dissidentes de partidos com fortes ligações aos aparelhos partidários.

Tem também havido uma melhoria da transparência, com iniciativas governamentais como o Portal Autárquico (www.portalautarquico.pt) e não-governamentais como o Índice de Transparência Municipal (https://transparencia.pt). A imprensa local em Portugal varia bastante entre regiões, tanto em qualidade como em tiragem. Seria interessante estudar os efeitos desta diversidade — sabemos que, no Brasil, a existência de imprensa local diminui a corrupção nos municípios.

A democracia local, tal como a democracia ao nível do governo central, é um processo em contínua melhoria. Sem dúvida que o mecanismo principal é o voto — de resto, o Prémio Nobel da Economia Amartya Sen mostra-o claramente quando aponta a inexistência de episódios de fome generalizada na Índia, uma democracia, contrariamente à China, um estado autocrático. Quarenta anos depois desta conquista fundamental, não devemos coibir-nos de continuar a refletir em maneiras de melhorar a nossa forma de governo colectivo. A mais simples, e que tem a vantagem de depender apenas de cada eleitora e eleitor individual, é ir votar no dia 1 de Outubro.

A autora escreve segundo as normas do novo Acordo Ortográfico

CIDADANIA SOCIAL - Associação para a Intervenção e Reflexão de Políticas Sociais 





Professora na Nova School of Business and Economics


segunda-feira, 10 de julho de 2017

Portugal Injusto









Jorge Miguel Bravo



Portugal é um país intergeracionalmente justo?

O problema da justiça intergeracional é complexo e, em tese, politicamente controverso mas tal não deve servir para que os conflitos entre as preocupações e os interesses de diferentes gerações sejam explorados para fins estritamente políticos.

10 de Julho de 2017

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O que constitui uma sociedade intergeracionalmente justa? Quais são as responsabilidades, os deveres, as exigências específicas para uma justiça entre gerações? Em que princípios normativos se baseia este conceito? Portugal é um país intergeracionalmente justo? O que pensam os portugueses sobre esta matéria? Estarão eles de acordo quanto à ambição de ter uma sociedade justa entre gerações e quanto ao que isso significa em termos de contribuições e benefícios? Estamos hoje melhor ou pior do que a geração dos nossos pais e avós? Que legado estamos a deixar aos nossos filhos e netos? O que lhes devemos? Como são distribuídos os recursos entre gerações? Como podemos tornar Portugal um país intergeracionalmente mais justo?

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O debate sobre se é legítimo e desejável exigir sacrifícios à geração actual para salvaguardar as gerações futuras, e sobre quais são as responsabilidades, os deveres e as exigências específicas de uma justiça entre gerações tem ocupado, desde há décadas, o pensamento ético e político. Trata-se de um debate marcado por diferentes correntes de pensamento. Entre elas encontra-se, desde logo, o argumento de que cada pessoa tem a obrigação de devolver aos outros aquilo de que ela própria beneficiou, se tiver naturalmente condições de o fazer, ou o princípio segundo o qual a satisfação das necessidades da geração actual não pode por em causa a possibilidade das futuras gerações fazerem o mesmo. Outras correntes sustentam a noção de que todas as gerações beneficiam do contrato intergeracional, de que existem vantagens mútuas em cooperar. O utilitarismo justifica a existência de sacrifícios em nome de um bem maior comum. O princípio da "poupança justa" de John Rawls estipula que cada geração que receba um legado das predecessoras deve racionalmente contribuir com a sua parcela para as que se lhe sucederão, através da realização de investimentos, por exemplo, na educação, na ciência ou na cultura.

Um leque amplo e diversificado de preocupações são correntemente subsumidas sob a rubrica da justiça intergeracional. Entre elas incluem-se as prestações sociais (sobretudo as pensões), a dívida pública, o investimento público, a habitação, o mercado de trabalho, a degradação ambiental e o consumo de recursos naturais ou o acesso à educação e saúde. Para os cidadãos e para os decisores políticos a grande questão que se coloca é a de saber em que medida se encaixam estas diferentes concepções ético-políticas sobre justiça entre gerações na ambição de alcançar, de forma sustentada, uma sociedade próspera, equitativa e solidária.

Nos últimos anos cresceu, na sociedade portuguesa, a percepção de que em muitos domínios determinantes do bem-estar, da qualidade de vida, da coesão social e da igualdade de oportunidades (e.g., educação, saúde, mercado de trabalho, salários e pensões, segurança, preservação do ambiente, igualdade de género) pode ter ocorrido um retrocesso social.

Em simultâneo, engrossou o interesse pela identificação dos factores que podem, no presente, contribuir para moldar os níveis de bem-estar futuros, e sobre a forma como as escolhas (públicas e privadas, individuais e colectivas) que fazemos hoje afectam as opções disponíveis para as gerações futuras. Nalgumas matérias como sejam, por exemplo, as que se referem aos encargos presentes e futuros com os sistemas públicos de protecção social e de saúde, acentuou-se o debate público sobre a existência de condições objectivas que assegurem a sua sustentabilidade económica, demográfica e financeira, e aumentaram as vozes que reclamam a inevitabilidade de um reajuste no contrato intergeracional implícito, no sentido de o tornar mais equitativo entre gerações.

Num estudo pioneiro que coordenei recentemente na Universidade Nova de Lisboa (NOVA IMS), realizado para a Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) e que será apresentado publicamente nos próximos meses, efectuámos pela primeira vez em Portugal uma tentativa de identificar quais as responsabilidades, quais os deveres e quais os requisitos específicos que uma sociedade intergeracionalmente justa deve cumprir. O estudo analisa o tema da justiça intergeracional a partir de dois planos distintos. No plano subjectivo, o estudo procura conhecer, com recurso a um inquérito de opinião e uma amostra representativa, quais são as percepções, as atitudes e as orientações normativas da sociedade portuguesa em relação à noção de uma sociedade justiça entre gerações, em relação aos problemas e conflitos suscitados pela transferência de recursos (públicos e privados) entre gerações e relativamente às desigualdades e injustiças na distribuição dos recursos em domínios como a educação, o mercado de trabalho, o rendimento e a riqueza, a habitação ou as prestações sociais.

No plano objectivo, o estudo define, conceptual e metodologicamente, um novo Índice Compósito de Justiça Intergeracional e calcula o seu valor para o período entre 1995 e 2015. O índice assenta numa definição de justiça intergeracional segundo a qual "uma sociedade justa entre gerações é uma sociedade que é capaz, de forma coesa, equitativa e com igualdade de oportunidades, satisfazer as necessidades e expectativas da presente geração sem comprometer a capacidade das futuras gerações poderem vir a fazer o mesmo e a alcançarem, pelo menos, um nível de bem-estar tão elevado quanto o usufruído pelas actuais gerações".

O estudo avalia a performance do país em quatro grandes dimensões da justiça intergeracional:

a.       Satisfação das necessidades, bem-estar e qualidade de vida;

b.       Coesão social e igualdade de oportunidades;

c.       Preservação e investimento nos recursos (humanos, naturais, económicos, sociais);

d.       Sustentabilidade económica e financeira do país, em particular no domínio das finanças públicas, do equilíbrio externo, dos sistemas de pensões, do endividamento do sector privado.

Entre as múltiplas conclusões que foi possível retirar a partir dos resultados do inquérito de opinião, destaco os seguintes:

·        Os portugueses concordam com a noção de que uma sociedade justa em sentido lato deve recompensar, de forma diferenciada, aqueles que, através do seu trabalho, da sua capacidade e do seu mérito apresentam melhores desempenhos, mas atender igualmente à satisfação das necessidades dos mais carenciados;

·        A ideia genérica de reciprocidade entre gerações materializada, por exemplo, na noção de que devemos deixar às gerações seguintes pelo menos o equivalente ao que recebemos das gerações precedentes, encontra-se bastante enraizada na população portuguesa;

·        a rejeição inequívoca das políticas públicas e privadas que comprometem inexoravelmente a capacidade das gerações futuras poderem satisfazer as suas necessidades de bem-estar, em particular o aumento irresponsável dos níveis de dívida pública;

·        a existência de uma forte percepção de desigualdade na distribuição do rendimento e da riqueza em Portugal, em particular entre os grupos sociais mais desfavorecidos;

·        a percepção de que o actual sistema de pensões é iníquo e injusto entre gerações e vai proporcionar à próxima geração de pensionistas piores condições materiais de vida;

·        uma forte percepção de iniquidade na relação entre aquilo que os portugueses pagam e o que recebem nas trocas sociais;

·        a percepção de que existe hoje maior igualdade de oportunidades no acesso à educação e à saúde, mas maior dificuldade no acesso à habitação e ao mercado de trabalho;

·        jovens e menos jovens consideram-se insuficientemente representados pelos partidos políticos, pelos órgãos democráticos e pelas organizações sindicais no processo e na decisão sobre as principais matérias que lhes dizem respeito;

·        Uma forte percepção de que a classe social e as relações familiares são determinantes na mobilidade social ao longo do ciclo de vida.

O problema da justiça intergeracional é complexo e, em tese, politicamente controverso mas tal não deve servir para que os conflitos entre as preocupações e os interesses de diferentes gerações sejam explorados para fins estritamente políticos. Em vez disso, urge encontrar medidas precisas e objectivas dos desequilíbrios existentes na afectação e distribuição dos recursos no presente, e na preservação e investimento nos recursos que sustentarão o bem-estar das futuras gerações. Só assim estaremos em condições de acabar com injustiças efectivas e percebidas e de contribuir para um Portugal intergeracionalmente mais justo.

Economista, Professor na NOVA IMS - Universidade Nova de Lisboa e membro da direcção da Cidadania Social

CANDIDATOS INDEPENDENTES


Nota: Podemos não concordar com o autor mas coloca algumas reflexões interessantes.








Gonçalo Quadros



A favor de candidaturas independentes

As candidaturas independentes têm o mérito de desafiar as feias organizações em que se tornaram muitas das estruturas partidárias.

10 de Julho de 2017

As candidaturas independentes são muitas vezes reduzidas à figura do candidato a presidente da câmara ou encaradas como uma manifestação de ressabiamento de facções, ou de indivíduos, de organizações partidárias. Mas essa análise esconde o essencial. O mérito de uma candidatura independente não assenta numa superioridade de candidatos que nada têm a ver com estruturas partidárias nem traduz uma desistência dos partidos. Pelo contrário. As candidaturas independentes têm, neste momento, o mérito de desafiar as feias organizações em que se tornaram muitas das estruturas partidárias por esse país fora. O mérito de permitir que os cidadãos reclamem melhores partidos. Competindo com eles? Sim, se for preciso. E, aqui e agora, é.

Os partidos existem para nos proporem uma visão de comunidade e sociedade e os modelos de organização para a concretizar. O seu objectivo primeiro é alcançarem a governação, o poder. Serem Estado. Acontece que alguns partidos são, em boa verdade, a antecâmara do Estado, sendo por vezes vistos por muita gente como a antecâmara de acesso aos privilégios que o Estado, com os seus imensos recursos, pode proporcionar. Esse facto e a inexistência de estímulos para se tornarem melhores tende a tornar essas estruturas em organizações medíocres, sem brilho nem ambição.

Na realidade, no nosso sistema político, alguns partidos — por vezes fala-se do “arco da governação” — dão como adquirido o acesso ao poder. Mais tarde ou mais cedo, inexoravelmente, ele chegará, quanto mais não seja através da alternância. Nesse contexto, em que apenas o tempo, e não o mérito, é necessário para se atingir o objectivo principal da organização, o que se pode esperar? Não muito mais do que laxismo e facilitismo. E com eles a falta de transparência, o oportunismo, o terreno fértil para a troca de favores e para quem se procura servir em vez de servir.

É neste contexto que, em muitos lados no país, e em particular em Coimbra, os cidadãos tomaram a iniciativa de chamar a si a intervenção política e decidiram competir com os partidos. Não para que que eles desapareçam, mas sim, pelo contrário, na expectativa de contribuir para que eles não se tornem irrelevantes. Não para dizerem que não querem os partidos, mas para afirmarem que querem mais, muito mais, do que aquilo que lhes é dado — mais competência, mais ambição, mais ousadia, mais transparência, mais honestidade.

Querem, em resumo, dizer que não vale tudo e que não aceitam tudo. E que para eles, os cidadãos, estarem disponíveis para confiar nos partidos, esses têm de ser muito mais exigentes com a forma como abordam o exercício do poder. Em vários aspectos, a começar logo nessa necessidade maior do nosso país que é a descentralização. 

Dizer tudo isto, denunciar tudo isto, exigir tudo isto, tem peso. São muitos os que o dizem. Mas, se as palavras são poderosas, passar delas aos actos é poderosíssimo. E passar das palavras aos actos, neste caso, é ir para o terreno, ouvir as pessoas e instituições, identificar problemas, construir com a comunidade propostas de soluções, apresentar um programa honesto, coerente e ambicioso.

Passar das palavras aos actos é dar esse passo que é tudo menos fácil: apresentar candidaturas independentes. E, fazendo-o, não só discutir, defender e lutar por uma visão para as nossas terras, como também criar um estímulo bastante forte para a melhoria dos partidos políticos que a devem servir.

No Porto, em Coimbra e noutros locais isso está a ser feito. Felizmente.

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CEO da CRITICAL Software