terça-feira, 10 de dezembro de 2019

De cimeira em cimeira, de acordo em acordo, passam os anos e a degradação climática não só aumenta como se agrava. Madrid vai ser mais um fracasso, pode o Guterres e a ONU bradarem aos céus que os deuses há muito não nos ouvem, muito menos os governos pois quem manda é a economia, e esta não vai deixar de produzir carros, aviões, armas etc. à base de energias fósseis.
O artigo que se junta é elucidativo e informativo, são dados objectivos.
MC



Clima e transição energética

O futuro não será a repetição do passado mas nesse futuro o papel da geologia pode, como sempre, surpreender.

9 de Dezembro de 2019 António Costa Silva

A ameaça climática é um dos desafios do nosso tempo. Os resultados de estudos como o dirigido por Richard Muller, da Universidade de Berkeley, um dos mais exaustivos já levado a cabo, são inequívocos. A temperatura da Terra está a aumentar em todos os continentes e o Pólo Norte é o local do planeta que aquece mais. Nos últimos 30 anos perdeu 2 milhões de Km2 de gelo, que é um estabilizador do clima da Terra porque reflecte parte da radiação solar. O seu desaparecimento acelera o aquecimento dos oceanos e global. Como não podemos negociar com a Natureza, é preciso agir. E aí começam os equívocos.



Há uma dissonância entre a retórica política e os factos. As cimeiras sucedem-se, os gritos são muitos, mas na prática faz-se pouco. E quando se faz algo que pode ser decisivo ninguém liga porque toda a gente está mais preocupada em gritar. Os factos são incontornáveis: no ano 2000, já depois das primeiras cimeiras como a do Rio, as emissões de CO2 eram de 25.000 milhões de toneladas (mt) por ano. O planeta aguenta o máximo 18.000 mt. Em 2018, as emissões de CO2 chegaram a 34.000 mt, cresceram 36% só neste século. Mas em 2015 e 2016, depois de 30 anos consecutivos em que as emissões cresceram à média de 1,7% ao ano, elas estagnaram. Era um ponto de viragem se tivéssemos prestado atenção.

Estagnaram porque os EUA começaram a substituir as suas centrais a carvão por centrais a gás e as emissões são 60% inferiores. E a China decidiu congelar o seu programa de aposta no carvão e seguiu o caminho dos EUA. Com os dois maiores poluidores mundiais a reduzirem o uso de carvão, tivemos dois anos que podiam ser de viragem. Mas ninguém teve coragem de sentar o G-4 do carvão à mesa – China, EUA, Rússia e Japão, que consomem 75% do carvão no mundo – e levá-los a um compromisso sólido para diminuírem de forma consistente e prolongada o seu uso. Só a China consome 50% do carvão utilizado no mundo. Mas o carvão não é “sexy” como outras fontes energéticas que são demonizadas e poucos prestam atenção ao elefante na sala. 

Resultado: em 2019, como a China regista o crescimento económico mais lento desde os anos 90, decidiu recorrer de novo ao carvão, a fonte de energia mais barata, para estimular o crescimento económico e gerar emprego. O programa chinês do carvão foi reactivado e a China vai instalar nos próximos anos cerca de 148 GW de capacidade em centrais a carvão, o que equivale a toda a potência instalada na Europa. É uma péssima notícia para a China e para o planeta.

Neste contexto, as cimeiras e declarações políticas mostram hipocrisia. É fácil gritar. Mais difícil é pensar, trabalhar as soluções, sentar os decisores à mesa e urdir compromissos sérios e consistentes. 57% das emissões globais de CO2 são geradas pelo consumo de combustíveis fósseis: 2/3 provêm do sistema de geração eléctrica e térmica e 1/3 do sistema de transportes. É preciso ter a coragem de sentar à mesa o G-5 das emissões – China, EUA, Índia, Japão e Rússia, responsáveis por 65% das emissões de CO2. Para responder aos objectivos do Acordo de Paris de 2015 é preciso reduzir até 2040 40% do consumo de carvão e 15% de petróleo e aumentar 40% o consumo de energias renováveis. Isto é fazível, mas é preciso coragem para agir e políticas públicas bem desenhadas.

O sistema de geração eléctrica e térmica, apesar do aumento das energias renováveis, ainda gera 420 quilos de carbono por cada Mw de energia produzida. O máximo para a sustentabilidade do planeta deve ser 100 quilos de carbono por cada Mw gerado. Há um longo caminho a percorrer. O drama é que o consumo de energia primária continua a aumentar (+1,9% em 2018) para responder ao crescimento da população e da economia. É preciso mudar o paradigma e comportamentos e produzir energia mais limpa.

As soluções são multidimensionais. Passam pela mudança da matriz energética com mais energias renováveis e menos carvão e menos petróleo. Passam por um compromisso das companhias de petróleo e gás para diversificarem o seu portefólio; investirem mais nos activos de baixa intensidade carbónica; estabelecerem metas verificáveis de queima “zero” do gás e crescimento “net” zero das emissões, num prazo temporal curto; criarem produtos de baixa intensidade em carbono; apostarem nas tecnologias digitais para aumentar a eficiência e baixar as emissões. Passa pelo reforço do “cluster” das energias renováveis, em particular a eólica e solar, que são competitivas e que estão a crescer. Passa por mudanças no sistema de transportes com a electrificação da frota automóvel nas cidades que consomem cerca de 75% da energia do planeta e são responsáveis por 85% das emissões. Passa pela expansão da mobilidade eléctrica e da aposta nos biocombustíveis que não competem com as culturas alimentares. Passa por avanços na armazenagem da electricidade à escala da rede, com a revolução das baterias, que pode levar à electrificação de vastos segmentos da economia mundial. Passa pela digitalização das redes energéticas e a Internet da Energia com o “streamlining” das operações e a redução das emissões e do desperdício. Passa pela revolução do hidrogénio, cujos custos podem ser competitivos (se for gerado a partir do gás natural), e a sua aplicação nas “fuel cells” que podem ser uma alternativa sólida para a mobilidade, além de que podem capturar o CO2. Passa por soluções que apostam nos sumidouros naturais de CO2 como as florestas, os solos agrícolas bem tratados, o fim da desflorestação. O mau uso da terra é responsável por 20% das emissões de CO2. A captura do carbono, incluindo a captura directa a partir do ar, é outra solução que tem ganho tracção.

Finalmente, a geologia pode salvar o planeta. Há dois locais no mundo, os Montes Apalaches nos EUA e Omã, onde as rochas do manto afloram à superfície da terra. O manto está por baixo da litosfera, a camada superficial da Terra. Quando as rochas do manto, como os peridotitos, afloram à superfície, elas mineralizam o carbono a uma escala e ritmo sem paralelo. É o processo mais barato de todos porque utiliza a energia química das rochas. O futuro não será a repetição do passado mas nesse futuro o papel da geologia pode, como sempre, surpreender.

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Professor do Instituto Superior Técnico

domingo, 8 de dezembro de 2019

Artigo que traça o longo caminho da evolução da política e pensamento social. Nós aspiramos ao imediato, para o tempo das nossas vidas. mas o tempo real tem outro tempo, por vezes longo para a nossa pressa individual.
MC

Democracia
Quais são os problemas atuais da democracia? Desigualdade, respeito pelo voto, corrupção e desenvolvimento económico.
4 de Dezembro de 2019  Francisco Bethencourt
Democracia entendida como regime político baseado no interesse de muitos e não de poucos, com voto igual de todos os cidadãos, tornou-se o regime dominante no mundo depois da Segunda Guerra Mundial. Como demonstrou John Dunn, a origem deste regime em Atenas no século VI a.C. não fazia prever tal sucesso. Os regimes monárquicos ou oligárquicos dominaram as formas de exercício do poder. A própria democracia de Atenas baseava-se em 30.000 cidadãos proprietários, pouco mais de 10% da população. Rejeitada pelos principais pensadores políticos até ao século XVII, com exceção qualificada da utopia de Thomas More, a democracia foi aflorada por revoltas camponesas e urbanas, bem como pelo pensamento político igualitário dos Levellers durante a guerra civil inglesa de meados do século XVII.
O século XVIII pode ser considerado como um período de viragem, primeiro com a revolução norte-americana, depois com a revolução francesa, que redigiu pela primeira vez uma declaração dos direitos do homem. Contudo, o conceito de democracia excluía os não-proprietários e as mulheres – facto assinalado pela declaração dos direitos da mulher elaborada por Olympe de Gouges, contemporânea de Mary Wollstonecraft e lutadora contra a discriminação feminina. O direito de voto universal para todos os adultos, homens e mulheres, levou século e meio até ser implementado, na Europa e no resto do mundo. A exclusão de minorias étnicas da cidadania definiu o lado sombrio da democracia na Europa central e oriental durante o século XIX; as campanhas de limpeza étnica e emigração forçada foram renovadas ao longo do século XX e replicadas pela guerra civil na Jugoslávia nos anos de 1990.
O relativo alinhamento de diferentes regimes políticos no mundo ocorre entre 1850 e 1960 com a restauração Meiji no Japão (1868), a revolução republicana na China (1911), o processo de descolonização suscitado pelas lutas de libertação na Ásia e na África. Os regimes fascista e comunista foram construídos contra a democracia parlamentar. A desigualdade interna com segregação formal resultante do sistema esclavagista foi perpetuada no sul dos Estados Unidos até aos anos de 1960, enquanto o apartheid na África do Sul se prolongou até aos anos de 1990. O passado histórico de opressão de vastas minorias ou mesmo maiorias, como nos casos sul-africano ou brasileiro, deixou marcas na sociedade atual. A democracia foi apropriada pela ordem do egoísmo, como dizia Babeuf, mas tornou-se incontornável na luta pela emancipação económica e social dos trabalhadores inscrita na declaração universal dos direitos humanos aprovada pela ONU em 1948.
Quais são os problemas atuais da democracia? Desigualdade, respeito pelo voto, corrupção e desenvolvimento económico. Como mostrou Joseph Schumpeter, a democracia tornou-se um mercado eleitoral controlado por políticos profissionais. A desigualdade económica e social está embebida no sistema, dada a diferença abissal de distribuição da riqueza, responsável pela ligação entre adjudicação de recursos e coerção do Estado. É essa desigualdade, bem analisada por Pierre Rosanvallon e Thomas Piketty, que deverá estar no centro da discussão sobre o futuro da democracia. A crise de representação é já visível na emergência de revoltas de protesto fora dos sistemas partidários em França, Hong Kong, Iraque, Chile, Equador e Bolívia.
Existe uma enorme sensibilidade de escrutínio das promessas eleitorais e de respeito pelos resultados eleitorais. A legitimidade do referendo britânico de saída da União Europeia foi colocada contra a legitimidade parlamentar, embora o referendo tenha sido viciado por promessas falsas de saída fácil e consensual, sem consequências económicas. O choque da realidade de saída reporá as condições da democracia britânica com enormes custos. Na Bolívia, o desrespeito pelo referendo contrário à candidatura para um novo mandato presidencial inconstitucional, seguido de fraude eleitoral, levou à demissão e exílio do Presidente Evo Morales por golpe de Estado. O resultado de 14 anos de desenvolvimento económico da Bolívia com redução radical da pobreza e promoção da população indígena está agora ameaçado dada a incapacidade de criar sucessores e respeitar as regras democráticas num contexto de cultura violenta da extrema-direita.
As populações estão cada vez mais conscientes do peso da corrupção na economia, contrário ao desenvolvimento. Em países democráticos com poderes judiciais independentes a corrupção é (ou deveria ser) investigada de forma isenta e objetiva, embora os resultados dependam da capacidade da polícia e dos magistrados envolvidos. No Brasil, a operação Lava Jato revelou a extensa corrupção ligada às grandes empresas Petrobras e Odebrecht (entre outras), com envolvimento de vários partidos, nomeadamente o PT. O impacto eleitoral foi imediato, resultando na emergência da extrema-direita. Sabemos também como a polícia e o poder judicial podem ser mobilizados para fins ilegítimos: a recente detenção de membros de organizações de proteção de incêndios na Amazónia indicia uma campanha de intimidação daqueles que denunciam a destruição da floresta. 
O clientelismo e a dependência de interesses económicos fazem parte da corrupção, patente na distribuição de fundos europeus para suprimir a oposição em países do leste da Europa, particularmente na Hungria, como mostrou uma reportagem recente do New York Times. A institucionalização do lobbying de interesses privados nos corredores do poder é um dos cancros da democracia americana: o lobby do carvão contribuiu para a campanha de Trump e foi recompensado com a destruição das políticas ambientais.
A estagnação económica desde a crise de 2007 contribuiu para o reaparecimento da extrema-direita. Enquanto as classes baixas e médias, no mundo ocidental, vivem de forma mais precária que as gerações anteriores, os mais ricos (1% da população) viram aumentar a sua parte do rendimento nacional em todo o mundo. O abandono das políticas neoliberais de austeridade e de redução das funções do Estado está em cima da mesa.
Os trabalhistas arriscam uma derrota esmagadora nestas eleições, não pelas políticas que propõem, mas pela incapacidade de liderança política de Jeremy Corbyn, que ao fim de três anos e meio do referendo se declara neutro na questão fundamental da saída (ou não) da União Europeia. A nacionalização de serviços básicos, reposição do nível de impostos do início do século e rejuvenescimento do Welfare State, inspiradas por Esping-Andersen, nada têm de revolucionário, seriam aceites pela direita liberal dos anos 50. A maioria dos ingleses está disposta a votar em Boris Johnson, um político reconhecidamente sem escrúpulos e sem caráter, sob a promessa de saída rápida da União Europeia, mas as consequências irão impor realinhamentos.
Neste ponto de viragem, o debate sobre quem beneficia das políticas económicas – a ordem da igualdade contra a ordem do egoísmo – vai conhecer uma nova intensidade.
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico
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Professor no King's College de Londres

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019


A sessão de apresentação teve a participação de várias dezenas de pessoas, e pessoalmente ou por mail e telefone muitas outras informaram não poder estar presentes mas interessadas em poder adquirir o livro.
Foi apresentado pelo meu amigo Carlos Brito e pelo editor Hélder Oliveira.
Informo que o livro estará à venda ainda esta semana na Livraria Lusíada frente ao Hotel Apolo.
Procurei neste livro recordar os vila-realenses que se opuseram ao regime salazarista e as duras consequências para eles e famílias que sofreram por terem tido a coragem e a dignidade de quererem um país mais justo.
Hoje estas pessoas estão esquecidas mas existiram e merecem ser recordadas pelo seu exemplo e abnegação. Foi esse o meu propósito, dar-lhes vida, mais a mais numa altura em que aparecem reaccionários a tentar branquear o fascismo como o "Chega". No livro está lá quantos presos políticos existiram, quantas pessoas foram assassinadas pela PIDE e não só, quantas prisões políticas haviam e muitos outros dados, juntando num só livro informações que em geral andam dispersas, possibilitando assim um retrato mais completo sobre esse período triste e negro da nossa história.
O livro foi custeado por mim, não quis patrocinadores, nem aceitaria qualquer influência sobre o seu conteúdo.
Martins Coelho
A Mesa da Sessão




segunda-feira, 12 de agosto de 2019

Há momentos na História que é fundamental perceber o que se encontra em jogo, quer em Portugal quer na Europa, e encontramo-nos num momento desses.
MC


Portugal um alvo estratégico da extrema-direita
Da perspectiva da extrema-direita internacional, Portugal representa o elo fraco por onde ela pode atacar a União Europeia.
11 de Agosto de 2019
Boaventura Sousa Santos

Vários acontecimentos recentes têm vindo a revelar sinais cada vez mais perturbadores de que o internacionalismo de extrema-direita está a transformar Portugal num alvo estratégico. Entre eles, saliento a tentativa recente de alguns intelectuais de jogar a cartada do ódio racial para testar as divisões da direita e da esquerda  e assim influenciar a agenda política, a reunião internacional de partidos de extrema-direita em Lisboa e a simultânea greve do recém-criado Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas.
Várias razões militam a esse respeito. Portugal é o único país da Europa com um governo de esquerda numa legislatura completa e em que se aproxima um processo eleitoral, e é o único onde não tem presença parlamentar nenhum partido de extrema-direita. Será Portugal assim tão importante para merecer esta atenção estratégica? É importante, sim, porque, da perspectiva da extrema-direita internacional, Portugal representa o elo fraco por onde ela pode atacar a União Europeia. O objectivo central é, pois, destruir a União Europeia e fazer com que a Europa regresse a um continente de Estados rivais onde os nacionalismos podem florescer e as exclusões sócio-raciais podem ser mais facilmente manipuláveis no plano político.
Para a extrema-direita internacional, a direita tradicional desempenha um papel muito limitado neste objectivo, até porque ela foi durante muito tempo a força motora da União Europeia. Daí que seja tratada com relativo desprezo, pelo menos até se aproximar, pelo seu próprio esvaziamento ideológico, da extrema-direita, tal como está a acontecer na Espanha. As forças de esquerda, ao contrário, são forças a neutralizar. Para a extrema-direita, as esquerdas ter-se-ão dado conta de que a UE, com todas as suas limitações, que durante muito tempo foram razão suficiente para algumas dessas esquerdas serem anti-europeístas, é hoje uma força de resistência contra a onda reaccionária que avassala o mundo. 
Não se pode esperar da UE muito mais do que a defesa da democracia liberal, mas esta corre mais riscos de morrer democraticamente sem a UE do que com a UE. E as esquerdas sabem por experiência que serão as primeiras vítimas de qualquer regime autoritário. Talvez se lembrem de que as diferenças entre elas sempre pareceram mais importantes quando vistas do interior das forças de esquerda do que quando vistas pelos seus adversários. Por mais que socialistas e comunistas se digladiassem no período pós-Primeira Guerra, Hitler, quando chegou ao poder, não viu entre eles diferenças que merecessem diferente tratamento. Liquidou-os a todos.
Não é relevante saber se é isto o que as esquerdas pensam. É isto o que a extrema-direita pensa sobre as esquerdas, e é nessa base que se move. Quem a move? Movem-na forças nacionais e internacionais. São várias e com objectivos que só parcialmente se sobrepõem. Para surpresa de alguns, a política internacional dos EUA é uma delas. Os EUA são hoje um defensor muito condicional da democracia, pois só a defendem na medida em que ela é funcional aos interesses das empresas multinacionais norte-americanas. A razão principal é a rivalidade entre os EUA e China que está a condicionar profundamente a política internacional. O confronto entre dois impérios, um decadente e outro ascendente, exige o alinhamento incondicional dos países aliados de cada um deles ou na sua zona de influência. A Europa fragmentada será um conjunto de países ou facilmente pressionáveis ou irrelevantes (a Alemanha é o único que exige atenção especial). 
Mais do que nunca, são os interesses económicos que dominam a diplomacia. Assim, segundo a BBC de 9 de Agosto, os tweets em chinês do Presidente Trump têm mais de 100.000 seguidores entre os dissidentes chineses que consideram o Presidente norte-americano um defensor dos direitos humanos. E certamente o será no contexto da China e porque isso serve os interesses da guerra com a China. Não é por acaso que a China está a culpar os EUA pela onda de protestos em Hong Kong. Mas Trump já não é credivelmente um defensor dos direitos humanos ante os venezuelanos sujeitos a um embargo cruel e devastador que a própria ONU considera uma violação grosseira dos direitos humanos.
A extrema-direita conta com três instrumentos fundamentais: aproveitamento da contestação social contra medidas de governos considerados hostis, exploração de idiotas úteis e, no caso de governos mais à esquerda, maximização das dificuldades de governação decorrentes das coligações existentes. Do primeiro caso, talvez sirva de ilustração a greve do Sindicato de Motoristas de Matérias Perigosas. Este tipo de greve pode ter efeitos tão graves que desmoralizem qualquer governo. Tradicionalmente os sindicatos sabem disso, negoceiam forte e ao mesmo tempo sabem até onde podem ir para não pôr em causa interesses vitais dos cidadãos. Não é isto o que tem ocorrido com este sindicato. É altamente suspeita a linguagem radicalizadora do vice-presidente do sindicato (“deixou de ser um direito laboral para ser uma questão de honra”), uma personagem aparentemente arvorada em anjo protector de sindicalistas descontentes. A história nunca se repete mas obriga-nos a pensar. O governo democrático socialista de Salvador Allende, hostilizado pelas elites locais e pelos EUA, sofreu a sua crise final depois das greves de sindicatos de motoristas de combustíveis, precisamente devido à paralisação do país e à imagem de ingovernabilidade que reflectia. Soube-se anos depois que a CIA norte-americana tinha estado bastante activa por detrás das greves.
Os idiotas úteis são aqueles que, com as melhores intenções, jogam o jogo da extrema-direita, embora nada tenham a ver com ela. Cito dois. Quando foi da primeira greve do sindicato referido, alguns ingénuos sociólogos apressaram-se a dissertar sobre o novo tipo de sindicalismo não ideológico, exclusivamente centrado nos interesses dos trabalhadores. O contraste implícito era com a CGTP, essa sim considerada ideológica e ao serviço de obscuros interesses antidemocráticos. Se lessem um pouco mais sobre os movimentos sindicais do passado, saberiam que, em muitos contextos, a proclamação da ausência de ideologia política foi a melhor arma para introduzir a ideologia política contrária. Mas os idiotas úteis podem sair donde menos se espera. Um sindicalista que até há pouco muito admirei, Mário Nogueira, comportou-se a certa altura como idiota útil ao transformar as reivindicações dos professores motivo legítimo para fazer demitir o governo de esquerda apoiado pelo partido a que pertence. Este radicalismo, que confunde a árvore com a floresta, serve objectivamente os interesses desestabilizadores da extrema-direita.
Finalmente, a extrema-direita sabe aproveitar-se de todas as divisões entre as forças de esquerda, sabe ampliá-las e sabe usar as redes sociais para criar duas ilusões a partir de meias verdades. A primeira é que a maioria dos militantes e de anteriores dirigentes do Partido Socialista são de opinião que o PS sempre se deu melhor com alianças com a direita (o que é falso), não gosta do radicalismo de esquerda (que nunca definem) e que, de todo o modo, livres das esquerdas à sua esquerda, facilmente terão maioria absoluta (o que é improvável). A segunda é que recíprocas fracturas existem nos outros partidos de esquerda, ansiosos por regressar aos seus cantos de oposição e cansados de fazer concessões (o que em parte é verdade).
As forças de esquerda em Portugal têm vindo a dar testemunho de um notável bom senso que dificulta as manobras da extrema-direita. Se seguirão neste caminho ou se se renderão às pressões internas e externas é uma questão em aberto.

Director Emérito do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra

Medo da estupidez
Li hoje “Portugal, um alvo estratégico da extrema-direita”, de Boaventura Sousa Santos. Quem não perceber isto não percebe nada. Não é só pena que tenho de quem não percebe: é medo.
Miguel Esteves Cardoso
12 de Agosto de 2019
Sempre admirei Boaventura Sousa Santos. Admiro-o porque é uma pessoa inteligentíssima que se ganha muito em ler. Admiro-o porque a maneira de pensar e de escrever dele enriquecem-me, poupam-me tempo, levam-me onde eu jamais seria capaz de chegar sozinho.
Adérito Sedas Nunes, o também inteligentíssimo criador do Instituto de Ciências Sociais que me apadrinhou mal acabei o meu doutoramento, também era um admirador de Boaventura Sousa Santos.
Porquê? Porque é uma pessoa que vale a pena conhecer. É um juízo utilitário até. É de esquerda? É. Mas ele ser de esquerda faz-me pensar que, se calhar, é melhor (mais justo, menos egoísta, mais generoso) ser-se de esquerda.
O que eu nunca penso – porque seria estúpido pensar assim de Chomsky ou Oakeshott – é que ele é um pensador interessante “apesar” de ser de esquerda ou de direita.
Eu considero-me um democrata liberal da escola de John Stuart Mill e, se puder escolher outro autor, de David Hume. Li, durante muitos anos, os filósofos mais recomendados, de direita e de esquerda, e foram estes com que mais engracei. Caso me permitissem um terceiro e um quarto seriam Platão e Rousseau. Aqui se vê que a minha costela liberal não equivale a um esqueleto inteiro.
Li hoje “Portugal, um alvo estratégico da extrema-direita”. A análise é preclara e perfeita. Boaventura Sousa Santos é um dos grandes defensores da democracia que ele (justamente) critica por ser fraca, pobre e mentirosa.
Quem não perceber isto não percebe nada. Não é só pena que tenho de quem não percebe: é medo.

quarta-feira, 22 de maio de 2019


  NOTA: a dias das eleições para o Parlamento Europeu em que os partidos e os candidatos falam sobretudo nos problemas nacionais esta reflexão sobre a forma das próprias eleições merece leitura.
MC
                                                              O que está errado nas eleições europeias?
Tal como estão configuradas, as eleições para o Parlamento Europeu são as principais responsáveis pelo desinteresse dos eleitores.
21 de Maio de 2019
JPTFernandes

1. Comecemos pelo que deveria ser óbvio para toda a classe política que se lamenta da elevada abstenção: tal como estão configuradas, as eleições para o Parlamento Europeu são as principais responsáveis pelo desinteresse dos eleitores. Imaginemos uma eleição onde a maioria dos eleitores conhece mal, ou desconhece de todo, aquilo em que é suposto votar, onde os candidatos a chefiar um governo são praticamente desconhecidos dos eleitores e os temas mais tratados durante a campanha eleitoral pelos partidos políticos concorrentes não coincidem, minimamente, com o objectivo principal das eleições.
Absurdo? Bem-vindo ao mundo surreal das eleições para o Parlamento Europeu. Pode ser observado ao vivo em todos os Estados-membros da União Europeia até 26 de Maio. Imaginemos, agora, que os actuais “partidos políticos europeus” — na realidade meros agrupamentos de partidos nacionais — constavam dos boletins de voto para as eleições para o Parlamento Europeu, em vez dos partidos nacionais. E que no boletim apareceriam, também, os nomes dos candidatos de cada “partido político europeu” a chefiar o governo (leia-se Comissão Europeia). Resultado mais provável: a maioria dos eleitores não conseguiria identificar correctamente a força política em que pretendia votar. Uma eleição que, na prática, contém tais distorções acaba por levar a uma perversão da lógica para a qual foi criada. Leva ao desinteresse e abstenção ou então a que os eleitores julguem politicamente o governo nacional. Mas, para isso, já temos as eleições legislativas nacionais. Assim, nem a União Europeia, nem os Estados-membros, nem a democracia ganham nada com um acto eleitoral desvirtuado.
2. A primeira entorse nas eleições para o Parlamento Europeu começa nos partidos nacionais, pois são isso mesmo: partidos políticos com agendas e objectivos de poder nacionais e uma ocasional agenda europeia — no caso português, obter mais apoios financeiros da União Europeia (para os mais cáusticos extorquir fundos). Claro que a retórica política partidária nega essa realidade, sobretudo quando se aproximam eleições europeias onde desponta o amor (e também o ódio) à Europa em discursos inflamados.
Ao coro europeísta juntam-se, usualmente, os titulares dos órgãos de soberania. Mas a realidade é outra, como os eleitores percebem. A escolha do candidato que vai chefiar a lista para o Parlamento Europeu é feita pela direcção partidária segundo lógicas de política nacional. Um clássico é enviar para o Parlamento Europeu um rival incómodo, por exemplo, aquele(a) que disputou a chefia nacional do partido e perdeu. Outra escolha clássica é a de uma figura partidária que tenha feito qualquer coisa relacionada com a União Europeia e que possa ser vista, pelos eleitores, como um especialista na área.
Quanto à maioria dos que integram as listas, independentemente dos seus méritos, são desconhecidos dos eleitores. A sua escolha obedece às usuais lógicas internas de clientelismo partidário. (Neste caso, o problema não é exclusivo das eleições para o Parlamento Europeu.) Mas há mais. Em democracia, votar numas eleições legislativas é, em grande parte, um julgamento político do(s) partido(s) que suportava(m) a governação política anterior. Todavia, para o cidadão comum, a anterior governação europeia e o que os deputados que integravam a legislatura 2014-2019 fizeram ou não fizeram no Parlamento Europeu, é basicamente um mistério. Poucos serão capazes de se lembrar de algum acto político ou legislativo onde o partido e os deputados por si eleitos tenham tido algum papel. Talvez a directiva sobre os direitos de autor no mercado único digital seja um raro caso que ficou na memória. 
3. Realizar eleições europeias sem existir um povo europeu — uma condição sine qua non para genuínos partidos políticos europeus — acaba por transformar-se numa ficção democrática. Como já notámos, em democracia, o voto do cidadão envolve um julgamento político do governo e do(s) partido(s) político(s) que o apoiou(aram). É fundamentalmente um veredicto sobre forma como se governou, ou seja, foi exercido o mandato que os eleitores lhe atribuíram. 
Tudo isto qualquer cidadão entende e pode, então, formar o seu sentido de voto em conformidade. Mas o que vai julgar politicamente o cidadão nas eleições para o Parlamento Europeu? A Comissão de Jean-Claude Juncker, com comissários indigitados pelos governos nacionais (e da área política dos mesmos), à direita e à esquerda? O Partido Popular Europeu, de centro-direita, que suportou politicamente o “governo” Juncker no Parlamento Europeu? Mas quantos eleitores irão votar nos partidos de centro-direita (no caso português no PSD e CDS), porque avaliam positivamente a governação de Jean-Claude Juncker? E quantos identificam, se é que conhecem, Manfred Weber com o candidato a presidente da Comissão? O mesmo vale para outras áreas do espectro político. No centro-esquerda o problema é similar. Quantos eleitores europeus e portugueses (neste caso, do PS) votam porque rejeitam o legado do “governo” Juncker e querem escolher Frans Timmermans para chefe da futura Comissão Europeia? E os votantes nos partidos de esquerda radical ou comunistas (BE e PCP no caso português) e de outros Estados europeus, sabem mesmo que estão a votar no Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia e em Nicolas Cue para candidato à Comissão Europeia?
4. A nível europeu, há coisas que deviam ser claras para todos.  Uma delas é que o aumento de competências da União Europeia, ocorrido ao longo das últimas décadas, com importantes transferências de soberania dos Estados-membros para esta, alterou os processos políticos.
Uma das consequências que daí resultou, e que muitos não anteciparam, foi a transferência da contestação da política nacional para a política europeia. Assim, a perda do “estado de graça” da União Europeia é uma consequência natural — e inevitável — do processo de aumento das suas competências e poderes. As decisões políticas e legislativas geram, em qualquer sociedade democrática, crítica e oposição, por vezes de grande intensidade e até contra as próprias estruturas do Estado.
No passado, essa contestação ficava quase toda no âmbito da política interna dos Estados. Agora transferiu-se também, em força, para União Europeia. A razão, como já explicado, é que esta dispõe de um poder decisão política e legislativa em muitas áreas onde anteriormente só os Estados nacionais tinham esse poder. E o poder gera resistência e contestação. Pela forma tecnocrática como a construção europeia surgiu e se desenvolveu criou-se uma ilusão: a de se poder viver num mundo (a)político que não existe, pelo menos em democracia — uma espécie de País das Maravilhas de Lewis Carroll sem Alice e sem a malévola rainha de copas. Os “bons alunos” do Partido Popular Europeu (PPE) — o clássico centro-direita de poder — e da Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (S&D) no Parlamento Europeu — o clássico centro-esquerda —, com a sua tradicional hegemonia, alimentaram a ilusão. Os lugares que obtiveram para as suas clientelas nas instituições europeias, duplicando os cargos políticos que escasseavam a nível nacional, deixavam-nos satisfeitos.
Nesse mundo maravilhoso, a União Europeia aumentava as suas competências de “soberania”, assumindo poderes que antes eram dos Estados nacionais. Ao mesmo tempo, os contestatários e os radicais, à direita e à esquerda, mantinham-se fora, entretidos com a política nacional. Não importunavam o mundo maravilhoso da política europeia. Exceptuados partidos menores que ajudavam na imagem de pluralismo, competia-se (quase só) por ser mais europeísta do que os outros. Quanto aos eurodeputados, tinham o privilégio de quase ninguém escrutinar o que faziam, ou não faziam, durante os mandatos no Parlamento Europeu.
5. Esta “Wonderland” europeia está a ruir. Não estamos, todavia, perante o apocalipse do Evangelho de São João como alguma teologia europeísta quer fazer crer. Na realidade, esse discurso alarmista ilude o problema principal: uma eleição que, tal como está configurada, se desvirtua a si própria nos seus objectivos. Não é por acaso que mais de metade da população europeia nunca vota (veremos se o padrão se mantém). É o falhanço óbvio de uma solução que visava superar o défice democrático europeu. Há basicamente duas maneiras de corrigir esse falhanço. 
Uma primeira é voltar à solução anterior a 1979, onde os deputados que integravam o Parlamento Europeu eram designados pelos parlamentos nacionais. Acaba, apesar do retrocesso, a ficção de eleições europeias.  A segunda é avançar para eleições genuinamente europeias, o que é uma gigantesca tarefa de criar duas coisas que não existem: um povo europeu e partidos políticos europeus (para já, temos os incipientes Democracia na Europa Movimento 2025 — DIEM25 e o Volt Europa). Resta saber se esta segunda solução é uma mera utopia ou algo politicamente realizável. Mas, a manter-se o statu quo, é racional que os eleitores adoptem uma de duas atitudes: irem votar por motivos de política nacional, a favor ou contra o(s) partido(s) de governo; ou ignorarem estas eleições, pois não compreendem  aquilo em que lhe é pedido votar, nem lhe vêem utilidade.
Quando assim é não espanta que partidos populistas ou nacionalistas, partidos piratas, personagens cómicos e outros menos cómicos e bem mais perigosos politicamente, tenham nas eleições europeias um terreno favorável. Nem que os eleitores, irritados com políticos que os ignoram e tomam por parvos, a não ser quando as eleições europeias se aproximam, não votem, ou votem para se vingarem em partidos que não votariam em eleições importantes: as legislativas nacionais.
Investigador do IPRI-NOVA

sábado, 19 de janeiro de 2019







A partidocracia destrói a democracia
Os partidos, que deveriam ser a essência da democracia, estão a aniquilá-la.
17 de Janeiro de 2019 Paulo de Morais
Criados para representar as diferentes visões da sociedade, ao serviço do eleitorado, os partidos políticos estão em fase acelerada de degenerescência. São habitados por elites políticas que esqueceram os cidadãos e tudo fazem agora para manter os privilégios de que se foram apropriando. São os principais responsáveis pela abstenção, pelo desinteresse crónico pela política e pela crise da democracia.
O principal objectivo dos maiores partidos portugueses é, na verdade, manterem-se na esfera do poder, partilhar negócios de Estado com os grupos económicos de que são instrumento e garantir emprego aos muitos milhares de apaniguados, os militantes partidários e seus familiares.
O seu primeiro desígnio é eliminar a concorrência. Instalados no poder, os partidos do sistema (PSD, PS, CDS, Bloco e PC) garantem o exclusivo das candidaturas ao Parlamento, para que personalidades independentes não possam ter assento na Assembleia da República. Não permitem a entrada no seu feudo parlamentar de independentes, obstaculizam o acesso a novos partidos. Para beneficiar os maiores, permitem-se violar o princípio da proporcionalidade, que a Constituição exige: em 2015, um deputado do PSD ou do PS foi eleito com 20 mil votos, mas já o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista necessitam para a sua eleição de cerca de 30 mil votos. Além do mais, impedem que outras forças políticas tenham acesso ao Parlamento, apesar de algumas delas terem recebido muitos mais votos do que os 20 mil que elegem cada um deles.
Os partidos nem sequer cumprem a Lei, em múltiplos aspectos, o mais escandaloso dos quais é o desrespeito pela legislação de financiamento político. São recorrentemente condenados, multados pelo Tribunal Constitucional; mas sem quaisquer consequências, porque o Estado sempre permite a prescrição, no tempo, das sanções que aplica.
Estes partidos garantem ainda, apenas para si próprios, financiamentos de Estado permanentes. Usufruem de subsídios públicos de todo o tipo, com os quais mantêm uma máquina de propaganda, ilegítima fora de períodos eleitorais. Só em Portugal há, em permanência, propaganda partidária nas ruas, uma forma de lavagem cerebral sistemática. Utilizam até o domínio público como propriedade sua: são aos milhares os pequenos cartazes ilegais, degradados, apensos a candeeiros públicos, de propaganda ao Bloco de Esquerda e do Partido Comunista. Este lixo urbano deveria ser removido pelas câmaras; o que não acontece, porque os partidos estão acima da lei.
Agarrados como lapas ao Estado, os dirigentes partidários distribuem benesses e privilégios pelas empresas que os financiam e para as quais vão mais tarde como assalariados. Foi o que sucedeu com as ruinosas parcerias público-privadas rodoviárias, cujo maior agente foi a Mota-Engil, que acabou a albergar quase todos os ex-governantes do sector das obras públicas: de Jorge Coelho a Seixas da Costa, do PS, a Valente de Oliveira e Ferreira do Amaral, do PSD. O mesmo fenómeno de promiscuidade entre política e negócios marcou a onda de privatizações ao desbarato, manipuladas por políticos que hoje recebem tenças milionárias nas empresas que os próprios partidos privatizaram. O socialista Luís Amado preside à privatizada EDP, assessorado pelo social-democrata António Mexia e pela centrista Celeste Cardona. Para presidir à privatizada ANA, foi designado o ex-ministro José Luís Arnaut. A lista dos políticos de negócios é interminável, neste infernal sistema de portas giratórias que coloca o Estado ao serviço de interesses privados.
sobrevivência económica dos seus apoiantes através da atribuição de muitos milhares de empregos. Usam, para este fim, a Administração Central, as autarquias, as empresas municipais, os institutos públicos. Transformaram-se mesmo na maior agência de emprego do país.
Assim, os partidos tudo fazem para manter o status quo: controlam o sistema eleitoral, impedem a apresentação de alternativas, violam leis, utilizam recursos públicos em seu proveito, manipulam a opinião pública, enxameiam as televisões com comentadores facciosos, censuram todo o discurso contraditório. Ameaçados pelo desmoronar das bases democráticas, preferem apelidar de populista qualquer alvo em movimento, do que realmente regenerar a sua missão. Os partidos, que deveriam ser a essência da democracia, estão a aniquilá-la.
Presidente da Frente Cívica