quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

DIÁSPORA, FALÊNCIA DA DEMOCRACIA

Os portugueses não esperaram que Passos e companhia os mandassem embora, estão de novo a emigrar em massa como nos anos sessenta. A nossa diáspora aumenta sempre proporcionalmente à falência do país como nação viável para dar uma vida digna aos seus filhos.
É sempre assim, quando as coisas vão para o torto o português emigra, geralmente os melhores e mais activos, recusam a situação, mas não lutam para a alterar. 
Neste momento a crise deliberadamente provocada pelo sistema neoliberal na UE está a atingir fortemente a nossa emigração. No Luxemburgo mais de 4 mil já estão sem trabalho, na Suíça mais de 10 mil etc. São sobretudo emigrantes sem qualificações, mão de obra que é a primeira a ser descartada. Muitos estão a ser obrigados a regressar a Portugal.
Ao mesmo tempo há uma forte saída de portugueses, este ano calculada à volta dos 120 mil mas o número deve ser superior. O traço destes novos emigrantes não é o trolha, o pedreiro, o pescador, são sobretudo jovens engenheiros, gestores, economistas, médicos, professores, cientistas etc.
São pessoas formadas em Portugal, paga a sua formação por nós, e agora vão beneficiar outros países com os seus conhecimentos e saberes.
Outro traço desta emigração é que não é torna-viagem, não emigra para regressar e construir a casinha, a maioria afirma claramente que não pretende voltar. É a maior confissão de descrédito na nossa democracia e na descrença da capacidade política de melhorar o país.
Outro aspecto é que esta emigração não é para França ou Alemanha, está a ser maioritariamente absorvida pelo Brasil e Angola.
Há alguns anos escrevi sobre a emigração uma Nota Charingada no Jornal do Algarve que ilustra bem os dois momentos, o da altura em que foi escrito e o actual bem diferente.
NOTA CHARINGADA

Segundo alguns jornais noticiaram recentemente a Embaixada de Portugal em França vai lançar um concurso público para a construção de um memorial aos emigrantes portugueses, em Champigny, perto de Paris. Tal memorial pretende ser um símbolo dos portugueses que viveram em Champigny, a “Nova Lisboa”, como era conhecida, uma cidade de barracas que nos anos 60 albergava muitos milhares de portugueses que ali viviam em difíceis condições.
Fui lá uma vez, tinha chovido, os sapatos enterravam-se na lama. Saí de lá revoltado ao ver como viviam portugueses que um regime iníquo obrigara a sair do seu país à procura de uma vida mais humana e digna que em Portugal lhes era negada.
Nada tenho contra o referido memorial nem contra o seu simbolismo, ainda menos contra a ideia de, tardiamente, se prestar homenagem a esses homens e mulheres que tanto sofreram e lutaram para vencer na vida.
Agora que Portugal é simultâneamente um país de imigração e ainda de emigração é tempo de se prestar homenagem aqui (mais vale tarde do que nunca),aos seus emigrantes pelo contributo que deram e que dão à economia do seu país. Todos lhes somos devedores.
Este é um aspecto pouco conhecido dos portugueses mas as remessas que os emigrantes enviaram e enviam para Portugal são superiores aos tão badalados fundos comunitários, sempre valorizados em termos de opinião pública, e ajudaram a equilibrar a nossa balança de transacções correntes ou de pagamentos, tapando buracos e défices da nossa balança comercial.
Alguns exemplos: entre 1993 e 2000 o valor das remessas rondou os 5 mil milhões de contos e os saldos com a União Europeia representaram cerca de 3.800 milhões de contos. Em Dezembro de 2000 o total dos depósitos dos emigrantes, em bancos portugueses, totalizava  2.496 milhões de contos. De 2000 a 2003 os fundos transferidos pelos emigrantes para Portugal foram de 9.077,5 milhões de Euros. 
O Turismo proporciona a Portugal bastantes receitas, mas também aqui é bom não esquecer que uma parte significativa se deve aos emigrantes que vêm passar férias, rever a família pelo Natal etc. A contribuição dos nossos emigrantes verifica-se igualmente nas exportações de produtos tradicionais portugueses, na indústria da construção civil, nos investimentos em diversas áreas, nos impostos que pagam etc.
Existem portugueses emigrados em 123 países ao que consta, o que revela bem a dimensão da nossa diáspora. Casos de sucesso felizmente existem, mas quantos dramas e insucessos por esse mundo fora?
Em contrapartida a paga é má para quem tanto dá e ajuda. A assistência consular em muitos países é, no mínimo, deficiente; apoio à cultura e língua portuguesas fraca ou inexistente; política de apoio ao regresso e de reintegração social não há.
Tanto para dizer que o espaço de um jornal não chega. Não resisto a mais uma nota. É conhecida a desertificação humana do nosso interior mas, curiosamente, os depósitos bancários dos emigrantes são, em algumas destas zonas em perda de população, dos maiores. A Banca canaliza para investimentos e empréstimos no litoral essas poupanças e, mais uma vez, os pobres financiam os ricos.
Os governos sucedem-se sem que se materialize uma verdadeira política para a emigração. Quando as eleições estão à porta é ver os candidatos a deputados dos partidos que têm governado a prometerem o céu e a terra à emigração. A Banca, sempre ávida na caça das suas poupanças, não tem por eles qualquer consideração quando em momentos menos bons os emigrantes a procuram. Quantos não têm sido esbulhados por falências fraudulentas, por vigarices de toda a ordem, vendo-se no fim da vida em situações aflitivas ao perder assim o pé-de-meia tão sacrificadamente amealhado? Por tudo isto quantos memoriais e monumentos já não deveriam ter sido feitos por este país fora aos emigrantes?!


Martins Coelho 

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